segunda-feira, junho 22, 2009

Jesus e C. S. Lewis - mitologia na pregação?

Michelson, qual a opinião de Ellen G. White sobre os contos de fadas? Estou lendo o livro A Antropologia Filosófica de C. S. Lewis que fala bastante sobre As Crônicas de Nárnia. E é interessante o fundo cristão da obra, o simbolismo do leão Aslam com Cristo, na verdade, é um livro que parece ser altamente cristão. Claro que deve ser encarado como uma parábola. A questão é que Jesus contou uma parabola em que demonstra fatos irreais como inferno, contato entre mortos do inferno e do céu, etc. Porque C. S. Lewis não poderia fazer o mesmo? - P.

De fato, Ellen White não é muito favorável à ficção. Mas o que Lewis fez até considero válido, embora creia que, como adventistas, podemos focalizar melhor nossa pregação por meio de parábolas, como Jesus fez. Note que o Mestre não Se demora muito na crendice do povo da época (o inferno) e passa logo para a lição espiritual que queria dar, a misericórdia. Lewis se "diverte" longamente com a mitologia e passa a mensagem cristã de maneira mais discreta do que Jesus. Talvez resida aí a grande diferença na abordagem de ambos. Para tornar mais relevante a mensagem que devemos pregar, podemos utilizar elementos da cultura que nos rodeia, desde que isso seja feito com muito critério e equilíbrio necessários para discernir o que é utilizável e o que não é.

Note o que escreveu Ellen White:

"Há obras de ficção que foram escritas com o objetivo de ensinar verdades ou expor algum grande mal. Algumas dessas obras têm feito bem. Têm, por outro lado, operado indizível dano. Encerram declarações e descrições altamente elaboradas, que despertam a imaginação e suscitam uma corrente de pensamentos repleta de perigo, especialmente para os jovens. As cenas descritas são repetidamente vividas em sua imaginação. Tais leituras incapacitam a mente para a utilidade, tornando-a inapta para os exercícios espirituais. Destroem o interesse na Bíblia. As coisas celestiais pouco lugar encontram nos pensamentos. À medida que a mente se demora nas cenas de impureza descritas, desperta-se a paixão, e o fim é o pecado" (A Ciência do Bom Viver, p. 445 - grifos meus).

"Mesmo a ficção que não contém nenhuma sugestão de impureza, e que visa a ensinar excelentes princípios, é nociva. Anima o hábito da leitura apressada e superficial, unicamente pela história. Tende assim a destruir a faculdade de pensar com coerência e vigor; incapacita a alma para a contemplação dos grandes problemas do dever e do destino. Alimentando o amor de mera distração, a leitura de ficção cria aversão pelos deveres práticos da vida" (Conselhos aos Pais, Professores e Estudantes, p. 383 - gifos meus).

Michelson Borges

domingo, junho 21, 2009

Deus descansou ou trabalhou no sétimo dia?

Certa vez me fizeram a seguinte pergunta: Em quantos dias Deus criou o Céu e a terra? Respondi que foi em seis dias literais. Só que a pessoa argumentou que em Gênesis 2:1 e 2 diz: "E havendo acabado no dia sétimo", ou seja, ele queria dizer que foi em sete dias, porém, mostrei o mandamento sobre o sábado que diz que "em seis dias fez o Senhor Deus o céu e a terra..." e "no sétimo dia descansou". Não é difícil responder essa pergunta, só que eu gostaria de receber um comentário sobre esse texto para ter opinião bem formando sobre o assunto. – V.

A Bíblia não se contradiz. Se o quarto mandamento diz que a obra da Criação (ao menos no que diz respeito à Terra) durou seis dias (ver Êxodo 20:11), essa declaração está em harmonia com os seis dias da Criação, em Gênesis 1. Veja que em Gênesis 2:1, antes de Deus descansar no sétimo dia, Ele já havia acabado “os céus e a terra e todo o seu exército”. Quando o verso 2 diz que “havendo Deus terminado no dia sétimo a sua obra”, o autor bíblico está dizendo que quando chegou o sétimo dia, a obra de Deus já estava concluída. A Bíblia é clara em dizer que Deus “descansou” no sétimo dia. Ora, se descansou, então Ele não trabalhou nesse dia.

sábado, junho 20, 2009

Jesus e a mitologia pagã

Na verdade eu só tenho uma pergunta, e, para ser franco, ela me frustra inúmeras vezes. Acontece quase todas as vezes que eu debato cristianismo com alguém. A pergunta: “Jesus é um mito copiado ou uma pessoal real?” é a fonte de objeção que eu recebo a maioria das vezes. Eles listam todas as similaridades entre Jesus e outros deuses e constelações mitológicos e dizem “Vê como são parecidos?” Parece que não importa como eu refuto certa similaridade entre Cristo e outra crença mitológica, eles não levam muito a sério o que digo, porque respondem que “eu tenho trabalhado muito duro para salvar minha religião”. Esses argumentos são sólidos? Eles sequer são debatidos nos altos níveis acadêmicos ainda? Eu realmente gostaria de saber sua visão nesse ponto, pois continuo trombando nisso e francamente estou cansado de tentar refutar cada similaridade. - K.

Dr. William Lane Craig responde:

O falecido Robert Funk, fundador do radical Seminário Jesus, reclamava amargamente do abismo que existe entre os principais estudos e as crenças populares sobre Jesus. Funk pensava principalmente sobre a distância entre o pietismo popular e o conhecimento histórico sobre Jesus; mas em lugar algum o abismo é tão grande como entre a irreligiosidade popular e os estudos sobre o Jesus histórico.

O movimento do Pensamento Livre, que alimenta a objeção popular que as crenças cristãs sobre Jesus são derivadas da mitologia pagã, está empacado entre os estudos do final do século XIX. De certa forma isso é impressionante, já que existem muitos estudiosos contemporâneos céticos, como os do Seminário Jesus, cuja obra os livre pensadores poderiam utilizar a fim de justificar seu ceticismo sobre a compreensão tradicional de Jesus. Mas isso só serve para mostrar como esses popularizadores não têm contato com o trabalho de estudiosos sobre Jesus. Eles estão um século desatualizados.

Voltando à época da chamada escola de História de Religiões, estudiosos em religiões comparadas encontraram paralelos a crenças cristãs em outras religiões, e alguns pensaram em explicar que essas crenças (incluindo a na ressurreição de Jesus) foram influenciadas por esses mitos. Hoje, no entanto, raramente algum estudioso pensa em mitos como uma categoria importante para se interpretar os Evangelhos. Os estudiosos perceberam que a mitologia pagã é simplesmente o contexto interpretativo errado para se compreender Jesus de Nazaré.

Craig Evans chama essa mudança de o “Eclipse da Mitologia” na pesquisa sobre a vida de Jesus (veja seu artigo excelente “Life-of-Jesus Research and the Eclipse of Mythology”, Thelogical Studies 54 [1993]: 3-36). James D. G. Dunn começa assim seu artigo sobre “Mitos” no Dicionário de Jesus e dos Evangelhos (IVP, 1993) com a clara rejeição: “Mito é um termo de, pelo menos, relevância duvidosa para o estudo de Jesus e dos Evangelhos.”

Algumas vezes essa mudança é referida como a “rejudaização de Jesus”, pois Jesus e Seus discípulos eram judeus do primeiro século, e é contra esse pano de fundo que devem ser compreendidos. A rejudaização de Jesus tem ajudado a tornar injustificada qualquer compreensão do retrato dEle nos Evangelhos como influenciado significativamente pela mitologia.

Essa mudança é proferida em relação à historicidade dos milagres e exorcismos de Jesus. Estudiosos contemporâneos podem não estar mais preparados para acreditar no caráter sobrenatural dos milagres e exorcismos de Jesus do que os estudiosos de gerações anteriores. Mas eles não estão mais dispostos a atribuir essas histórias à influência dos mitos gregos do homem-divino (theios aner). Antes, os milagres e exorcismos de Jesus devem ser interpretados no contexto das crenças e práticas judaicas do primeiro século. O estudioso judeu Geza Vermes, por exemplo, tem chamado a atenção aos ministérios dos realizadores de milagres e/ou exorcistas carismáticos Honi “o desenhista de círculos” (primeiro séc. a.C.) e Hanina ben Dosa (primeiro séc. d.C.) e interpreta Jesus de Nazaré como um judeu hassídico ou um santo. Hoje o consenso dos estudos sustenta que a realização de milagres e exorcismos (apoiando a questão de seu caráter sobrenatural) pertence, sem sombra de dúvida, a qualquer reconstrução historicamente aceitável do ministério de Jesus.

O colapso da antiga escola da História de Religiões ocorreu por principalmente dois motivos. Primeiro, estudiosos perceberam que os paralelos alegados eram ilegítimos. O mundo antigo era um lugar cheio de mitos de deuses e heróis. Estudos comparativos na religião e literatura requerem sensibilidade às suas similaridades e diferenças, ou o resultado será inevitavelmente distorção e confusão. Infelizmente, aqueles que apresentaram paralelos às crenças cristãs falharam em exercer essa sensibilidade. Veja, por exemplo, a história do nascimento virginal, ou, mais precisamente, a concepção virginal de Jesus. Os paralelos pagãos alegados a essa história são sobre lendas de deuses que se materializaram e tiveram relações sexuais com mulheres humanas para gerar uma prole humano-divina (como Hércules). Assim como esta, essas histórias são exatamente o contrário dos relatos dos Evangelhos, nos quais Maria concebeu Jesus sem ter tido nenhuma relação sexual. As histórias dos Evangelhos sobre a concepção virginal de Jesus são, na verdade, únicas no Oriente Próximo antigo.

Ou considere o evento dos Evangelhos que eu acho mais interessante: a ressurreição de Jesus dentre os mortos. Muitas das alegadas similaridades a esse evento são na verdade histórias apoteóticas, a divinização e assunção do herói ao céu (Hércules, Rômulo). Outras são sobre desaparecimentos, afirmando que o herói foi-se para um plano superior (Apolônio de Tiana, Empédocles). Outras ainda são símbolos sazonais do ciclo das colheitas, conforme a vegetação morre na estação seca e volta à vida na estação chuvosa (Tamuz, Osíris, Adônis). Algumas são expressões políticas de adoração aos imperadores (Júlio César, César Augusto). Nenhuma delas é similar à ideia judaica de ressurreição dos mortos. David Aune, especialista em literatura comparada do antigo Oriente Próximo, conclui: “nenhum paralelo a elas [tradições da ressurreição] é encontrado nos escritos greco-romanos” (“The Genre of the Gospels”, em Gospel Perspectives II, ed. R. T. France and David Wenham [Sheffield: JSOT Press, 1981], p. 48).

Na verdade, a maioria dos estudiosos chegou a duvidar se, apropriadamente falando, houve realmente algum mito de deuses que morriam e ressurgiam! No mito de Osíris, um dos mitos sazonais mais conhecidos, ele nem chega a voltar à vida, mas simplesmente continua a existir exilado no sub-mundo. Numa revisão recente da evidência, T. N. D. Mettinger informa: “A partir da década de 30... um consenso se desenvolveu ao significado que os deuses, 'que morriam e ressurgiam', morreram, mas não voltaram a viver novamente... Aqueles que continuam a pensar diferente são vistos como sobreviventes de uma espécie quase extinta” (Tryggve N. D. Mettinger, The Riddle of Resurrection: “Dying and Rising Gods” in the Ancient Near East [Stockholm, Sweden: Almquist & Wiksell International, 2001], p. 4, 7).

O próprio Mettinger acredita que mitos de deuses que morriam e ressurgiam existiram nos casos de Dumuzi, Baal e Melqart; mas reconhece que tais símbolos são bem diferentes da antiga crença cristã na ressurreição de Jesus:

“Os deuses que morriam e ressurgiam estavam muito ligados ao ciclo sazonal. Sua morte e retorno eram vistos como refletidas nas mudanças nas plantas. A morte e ressurreição de Jesus é um evento único, não se repete, e não está ligado às mudanças sazonais... Não existe, pelo o que eu sei, nenhuma evidência clara que a morte e ressurreição de Jesus são uma construção mitológica, baseada nos mitos e ritos dos deuses sazonais das nações vizinhas. Enquanto for estudada com proveito contra o pano de fundo da crença da ressurreição judaica, a fé na morte e ressurreição de Jesus mantém seu caráter único na história das religiões. O mistério continua” (Ibidem, p. 221).

Repare no comentário de Mettinger, que a crença na ressurreição de Jesus pode ser proveitosamente estudada contra o pano de fundo das crenças judaicas da ressurreição (não mitologia pagã). Aqui vemos aquela mudança nos estudos no Novo Testamento que eu apontei acima como a rejudaização de Jesus. A ilegitimidade das similaridades alegadas é apenas uma indicação de que a mitologia pagã é o esquema interpretativo errado para compreender a crença dos discípulos na ressurreição de Jesus.

Segundo, a escola da História de Religiões sucumbiu como uma explicação para a origem das crenças cristãs sobre Jesus, porque não houve nenhuma conexão causal entre os mitos pagãos e a origem das crenças cristãs sobre Jesus. Veja, por exemplo, a ressurreição. Os judeus conheciam os deuses sazonais mencionados acima (Ez 37:1-14) e os acharam repugnantes. Por isso, não há traços de culto a deuses sazonais na Palestina do primeiro século. Para os judeus, a ressurreição à glória e imortalidade não aconteceria antes da ressurreição geral de todos os mortos no fim do mundo. É inacreditável pensar que os discípulos originais teriam súbita e sinceramente acreditado que Jesus de Nazaré ressuscitou dentre os mortos apenas porque ouviram sobre mitos pagãos de deuses que morriam e ressurgiam.

Mas, de certo modo, tudo isso é irrelevante à sua pergunta principal, Kevin. Pois, como você mostrou, as pessoas com que você conversa não têm acesso aos estudos. Quando você mostra a elas a ilegitimidade das similaridades alegadas, então é acusado de “ter trabalhado muito duro para salvar sua religião”. Essa é uma situação que você não pode vencer. Então, estou inclinado a dizer-lhe que você não deveria ocupar-se em “tentar refutar cada similaridade”. Antes, eu acho que uma atitude mais genérica e desinteressada de sua parte pode ser mais eficaz.

Quando eles disserem que as crenças cristãs sobre Jesus vieram da mitologia pagã, acho que você deveria rir. Então olhe para eles com os olhos arregalados e um grande sorriso e diga: “Vocês realmente acreditam nisso?” Aja como se tivesse acabado de conhecer alguém que acredite na terra plana ou na conspiração de Roswell. Você podia dizer algo do tipo: “Cara, essas velhas teorias estão mortas há mais de cem anos! De onde você está tirando isso?” Diga-lhes que isso é apenas lixo sensacionalista e não estudos sérios. Caso insistam, então peça a eles que lhe mostrem as próprias passagens que narram a suposta similaridade. São eles que estão nadando contra o consenso dos estudos, então faça-os trabalhar duro para salvar a religião deles. Eu acho que você descobrirá que eles nem sequer leram as fontes originais.

Se eles chegarem a citar um trecho de uma fonte, acho que você ficará surpreso com o que verá. Por exemplo, no meu debate sobre a ressurreição com Robert Prince, ele dizia que as curas que Jesus fez vieram dos relatos mitológicos de curas, como as de Esculápio. Eu insisti que ele lesse a todos uma passagem das fontes originais mostrando a suposta similaridade. Quando ele leu, o que alegava não tinha nada a ver com as histórias dos Evangelhos sobre as curas de Jesus! Essa foi a melhor prova de que a origem das histórias não estava relacionada.

Lembre-se: qualquer um que insiste nessa objeção tem de suportar o ônus da prova. Ele precisa mostrar que as narrativas são paralelas e, além disso, que são causalmente ligadas. Insista que eles suportem esse ônus, caso você leve as objeções deles a sério.

(Blog Apologia)

Leia também: "Osíris e Hórus: protótipos do Jesus da fé?"

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