Será que guardamos o sábado correto? |
Irmão Michelson, não sou
adventista nem guardo o dia literal de sábado, mas entendo que pela contagem de
dias do sistema do nosso calendário ocidental não tem como literalmente guardar
o dia de sábado corretamente, até porque cada sábado da semana, na maioria das
vezes, não corresponde ao sábado que Deus instituiu pelo calendário hebreu. Ou
seja, vocês guardam o sábado achando que sempre guardam os sábados, mas,
na verdade, guardam também domingos, segundas, terças, quartas, quintas e
sextas. Cada mês do calendário hebreu começa na lua nova, e cada mês
tem somente 29 dias. Não entendo que guardar o sábado na nova aliança de
Cristo, que é o Senhor do sábado (Ele é o nosso Shabbat), que fez o sábado “para
o homem” (pois assim está escrito em Marcos 2:27), seja da mesma forma que
guardar o sábado na antiga aliança. Tudo se cumpre em Cristo, não em nossos
esforços. A verdade e a Palavra acima de tudo e de todos, ainda que elas nos
aborreçam! Sei que é difícil largar nossas crenças a favor da verdade... mas
elas não podem ser mais importantes que Aquele que é a própria verdade.
Amém?! Deus te abençoe! – F.
Resposta:
Prezado
F., a pedido do amigo Michelson Borges, tenho o prazer de responder a sua pergunta.
Realmente, toda a verdade deriva de uma pessoa divina, Jesus Cristo. Ele é a
própria verdade e devemos seguir Seu exemplo e Seus ensinamentos. Sua dúvida é
interessante e vou tentar respondê-la de forma bastante sucinta, lembrando que
basta algum conhecimento de história e uma boa pesquisa sobre como funcionam os
diferentes calendários pode resolvê-la. Não sei se você sabe, mas há registro
de que mais de 70 calendários diferentes já foram usados no mundo! Alguns deles
ainda são adotados pelo mundo hoje, em diferentes países ou por diferentes
religiões. O interessante é que a maioria absoluta desses calendários em uso ou
em desuso emprega uma semana de sete dias que não depende do ciclo mensal. Uma
pesquisa feita pelo bispo episcopal William Meade Jones no século 19 revelou
que em 160 idiomas diferentes o sétimo dia da semana tem uma aproximação
linguística muito nítida com a palavra hebraica shabbath, empregada na Bíblia. Em todas essas culturas o sábado é o
sétimo dia da semana.
A
dúvida que você expressou surgiu no século 19, quando Franz Delitzsch, um
estudioso da língua hebraica, propôs uma teoria para explicar o surgimento do
sábado. Na época, estava em moda entre muitos teólogos questionar a
historicidade do relato bíblico. Os teólogos liberais diziam que a maioria dos
textos bíblicos do Antigo Testamento foi escrita pouco antes ou pouco depois do
exílio babilônico e que não era um relato fiel da história. Alguns desses
teólogos acreditavam que a religião hebraica havia evoluído do politeísmo
mágico para um monoteísmo ético por volta desse tempo.
Delitzsch
inventou a teoria de que a guarda do sábado foi aprendida pelos judeus com os
babilônios. Acontece que no mês babilônico havia alguns “dias de azar”, em que
determinadas atividades deviam ser evitadas para não atrair maus agouros. Esses
dias eram datas fixas no mês. Como estavam dispostos em intervalos que variavam
entre cinco e dez dias, Delitzsch imaginou que esses dias de azar deram origem
ao sábado bíblico.
Acontece
que a teoria de Delitzsch para o surgimento do sábado semanal caiu em
descrédito diante das descobertas arqueológicas. Calendários hebraicos
pré-exílicos foram descobertos, evidenciando que os israelitas já tinham uma
semana de sete dias que independia do ciclo lunar mensal. A lua nova podia cair
em qualquer dia da semana, os dias do mês variavam na semana, e todas as festas
israelitas eram em datas móveis em relação aos dias da semana e fixas em
relação aos dias do mês. A importância do calendário israelita para a religião
deixou muitos registros escritos, de uma forma que hoje é possível calcular com
incrível precisão em que dia da semana e do mês israelita determinado evento
histórico aconteceu, além de ser possível a conversão das datas do calendário
israelita antigo para os calendários gregoriano ou juliano. Há inclusive
programas de computador que fazem esses cálculos. A história tem confirmado que
as palavras da Bíblia são um relato preciso do que realmente aconteceu.
Portanto, o sábado bíblico é o sétimo dia de um ciclo semanal que remonta à
criação do mundo (Gn 2:1-3; Êx 16; 20:8-11) e não depende do dia do mês.
É
interessante que os únicos calendários em que o ciclo da semana depende do
ciclo do mês foram os calendários da Revolução Francesa (semana de dez dias) e
o calendário adotado na União Soviética na década de 1930 (semana de seis
dias). Ambos os calendários foram criados por governos ateus com o claro
propósito de ocultar os dias de guarda das religiões judaica e cristã. Vale
lembrar que ambos os calendários vigoraram por breve tempo e não contaram com a
aceitação do povo.
Judeus
e alguns grupos cristãos têm guardado o sábado desde os tempos bíblicos. É
incrível como esses grupos de religiosos, muitos dos quais permaneceram séculos
sem contato uns com os outros, nunca perderam a contagem do sábado do sétimo
dia! Cristãos sabatistas na Índia, na Armênia, na Rússia, na Etiópia e na
Europa Central guardaram o sábado desde os primeiros séculos da era cristã,
sempre no mesmo dia da semana, apesar de um grupo não ter contato um com o
outro. Judeus chineses permaneceram até o século 19 sem contato com outros
judeus, mas observavam o mesmo sábado do sétimo dia de um ciclo semanal, o
mesmo dia que, no final do século 20, descobriu-se que o povo sul-africano
lemba observava havia mais de mil anos sem contato com outros povos observadores
do sábado. E note que esses grupos viveram cada um em uma cultura em que se
usava um calendário civil diferente, mas todos guardavam o mesmo sábado do
sétimo dia.
Portanto,
irmão F., o argumento de que o sábado nos tempos bíblicos era uma data mensal
não conta com nenhum fundamento. Vale lembrar que o calendário gregoriano,
criado no século 16, não alterou o ciclo semanal observado pela igreja desde os
tempos apostólicos e coincidente com o ciclo semanal de outros calendários. Da
mesma forma, há evidências mais que suficientes de que as reformas a que o
calendário israelita se submeteu até hoje só ajustaram o complicado esquema
lunissolar; nunca afetaram o ciclo semanal, que sempre foi independente dos
dias do mês.
Portanto,
os adventistas do sétimo dia e vários outros cristãos de outras igrejas que
guardam o sábado fazem-no com a segurança histórica de que observam como santo
o mesmo dia que Jesus Cristo, Paulo, os apóstolos e Maria, mãe de Jesus,
guardaram, segundo o Novo Testamento. O mesmo dia de um ciclo que vem desde a
criação do mundo. Um dia que, independentemente do calendário adotado, é o
sétimo dia da semana.
Há
uma interessante matéria sobre o assunto que escrevi para o blog do amigo
Michelson há alguns anos. Ela pode ser acessada aqui.
Também recomendo muito os livros Do Sábado Para o Domingo e O Sábado na Bíblia.
Não
sei se você sabe, mas os adventistas do sétimo dia guardam o sábado como um
sinal da aliança da graça. Assim como o pecador precisa cessar suas próprias
obras e descansar na graça de Cristo, o sábado é um símbolo real que lembra ao
cristão que, quando ele interrompe suas obras semanais e descansa no sétimo
dia, vive uma extensão prática da fé na graça de Deus, confiando que o mesmo
Cristo que pode suprir a salvação para um pecador que não tem como trabalhar
mais pela sua própria salvação, também supre com o sustento para essa vida
material quem entrega sua vida para Deus e nEle descansa. Ao ler Hebreus 4,
você perceberá como no Novo Testamento o sábado é apresentado como sinal de
nosso descanso em Cristo.
Espero
ter respondido a sua dúvida e incentivo você a conhecer melhor o sábado na
Bíblia e a confiança que o Espírito de Deus o guiará a um compromisso maior com
o Mestre Jesus Cristo.
De
seu irmão em Cristo, Fernando Dias.