O que simbolizam a meretriz, a besta
escarlate e os demais elementos de Apocalipse 17?
Sete séculos se passaram e mais de 70 papas se sucederam até
que um novo pontífice ousasse abdicar do chamado trono de Pedro. No dia 11 de
fevereiro de 2013, Bento XVI anunciou que declinaria de seu pontificado. “Bem
consciente da gravidade deste ato, com plena liberdade, declaro que renuncio ao
ministério de bispo de Roma, sucessor de São Pedro”, assim anunciou Bento XVI,
alegando sua idade avançada e decrescente vigor. Contudo, dias depois, Bento
XVI condenou a “hipocrisia religiosa” e afirmou ter enfrentado “águas
agitadas”, certamente em referência aos escândalos de pedofilia, lavagem de
dinheiro no Banco do Vaticano e, mais recentemente, de práticas homossexuais na
própria Cúria Romana. Em entrevista ao canal de notícias Globo News, no dia 27
de fevereiro deste ano, o arcebispo Dom Geraldo Majella confirmou que até a
vida de Bento XVI estava em perigo.
Contudo, as especulações sobre a renúncia de Bento XVI têm
ido muito além das questões internas do Vaticano. Em alguns círculos, elas
intensificaram uma expectativa em torno da chamada “teoria dos sete reis”,
construída sobre Apocalipse 17. A teoria enumera os papas a partir do estabelecimento
do Estado do Vaticano, em 1929, até a volta de Jesus. Portanto, Bento XVI, o
sétimo papa desde então e cujo pontificado foi relativamente breve, é visto
como o “rei” que tinha que “durar pouco” (Ap 17:10). Dessa forma, de acordo com
a teoria, o papa Francisco I, o oitavo, seria o último antes da segunda vinda
de Cristo (veja mais aqui).
Essa teoria não recebe o apoio da Igreja Adventista do Sétimo Dia, pois carece
de fundamentação bíblica, como veremos a seguir.
A meretriz e a besta – A interpretação de Apocalipse 17 é
um dos maiores desafios para o estudante da Bíblia. Não existe pleno consenso
sobre todos os pormenores dessa profecia. No entanto, com o avanço do estudo do
Apocalipse, mais luz tem sido lançada sobre essa incrível seção do livro.
Para se compreender os aspectos básicos de Apocalipse 17, é
preciso que se entenda o propósito da visão e seu lugar no livro. A visão tem
uma ligação direta com o capítulo 16, que trata das sete pragas, sendo que as
duas últimas afligem a Babilônia espiritual (Ap 16:12-21). Ao fim do relato
dessas pragas, um dos anjos que as derramaram convida João para ver o
julgamento (do grego krima,
“sentença”) da Babilônia espiritual, a “grande meretriz” (Ap 17:1). Em resumo,
o anjo quer mostrar por que Babilônia e seus apoiadores foram tão severamente
castigados por Deus (Jacques Doukhan, Secrets
of Revelation, p. 160).
João ouviu sobre uma meretriz “sentada sobre muitas águas”,
mas o profeta viu uma “mulher montada numa besta escarlate” (Ap 17:1, 3). A
figura da mulher nas profecias bíblicas sempre esteve relacionada ao povo de
Deus, à igreja (Gn 3:15; Os 2:19; Jr 3:14; 2Co 11:2), ao passo que a
prostituição sempre foi associada à infidelidade espiritual da igreja (Jr 3:20;
Ez 16:32; Ap 2:20). A meretriz é a contrafação da “noiva, a esposa do
Cordeiro”, que também foi apresentada a João por “um dos sete anjos que têm as
sete taças” (Ap 21:9). A “grande cidade” (Ap 17:18) tenta imitar a “santa
cidade” (Ap 21:10). Em síntese, a meretriz ou Babilônia pretende dominar o
mundo, com uma autoridade pretensamente divina, mas satânica em sua essência.
A simbologia religiosa também é evidente na aparência da
mulher, “vestida de púrpura e de escarlata, adornada de ouro, de pedras
preciosas e de pérolas” e com uma inscrição “na sua fronte” (Ap 17:4, 5),
elementos também presentes nas vestes do sumo sacerdote do antigo santuário (Êx
28:4-35; 35:9; 39:30; Ranko Stefanovic, Revelation
of Jesus Christ, 2ª ed., p. 517, 518).
A meretriz, portanto, representa um poder religioso que
exercerá domínio global nos últimos momentos da história (Ap 17:15). Mas esse
poder religioso não dominará sem ajuda. A meretriz precisará de apoio político
das nações para exercer influência sobre as massas humanas, assim como a
primeira besta depende da segunda, em Apocalipse 13. No capítulo 17, o
instrumento que ela utiliza para dominar a humanidade é a besta sobre a qual
está montada, que representa um poder político. Bestas (ou animais ferozes), em
profecias bíblicas, sempre representaram potências que oprimiram o povo de Deus
(Is 30:6, 7; Dn 7:5-7; 11, 19, 23; Ap 13:2, 11). A meretriz seduz a besta, e,
por meio dela, exerce domínio mundial.
As armas simbólicas de sua sedução estão em seu corpo e no
cálice que ela segura. Ela usa o corpo para se prostituir com os reis da Terra,
atraídos por seu luxo e aparência. A simbologia trata das alianças com os
governantes, para benefício mútuo (Ap 17:2; 18:3, 12-17; cf. Is 23:15-17; Ez
23:3, 30). Por sua vez, as multidões são enganadas pelo “vinho de sua
devassidão” contido no cálice (Ap 17:2, 4). Neste aspecto se representa o poder
sedutor da meretriz, que faz uso de um falso evangelho e de milagres (Ap 13:13,
14; 18:23; 19:20; Francis D. Nichol (ed.), The
Seventh-Day Adventist Bible Commentary, v. 7, p. 850).
A própria meretriz se achava “embriagada com o sangue dos
santos e [...] das testemunhas de Jesus” (Ap 17:6). Nos últimos momentos da história,
a meretriz, antes mesmo de tentar derramar sangue inocente, já está embriagada,
pois assassinou milhões de filhos de Deus por mais de um milênio (Dn 7:25).
Portanto, nenhum outro poder religioso pode se encaixar nessa descrição, além da
Igreja Romana.
Ellen G. White identificou a meretriz como a Igreja Romana (O Grande Conflito, p. 171), que será
julgada pelos crimes cometidos contra o povo de Deus ao longo da história (Ap
18:24) e até do sangue que intentará derramar no fim dos tempos (Nichol, p.
628). No entanto, a Igreja Romana não estará isolada como poder religioso. A
“mãe das meretrizes” (Ap 17:5) terá o apoio de outras organizações religiosas,
em especial, de outras denominações cristãs (O Grande Conflito, p. 382, 383). Portanto, essa confederação
religiosa formará a Babilônia mística.
A besta e suas cabeças
– Se a meretriz
representa uma confederação religiosa, a besta, os dez chifres/reinos e os reis
da terra (Ap 17:12, 13, 16) representam uma confederação política que a
sustentará no desfecho final. Há, portanto, uma distinção clara entre os
poderes político e religioso (Nichol, p. 851). Neste ponto se encontra o principal
equívoco da teoria dos sete reis como sete papas. Como as cabeças da besta seriam
sete papas, se a besta representa o poder político que dá suporte ao papado?
Outro erro: Se o oitavo rei representa o último papa, como ele se unirá aos dez
chifres/reinos em ódio mortal à meretriz (Ap 17:16), que representa o próprio
papado? O papa odiaria a si mesmo? Isso entra em contradição com o sentido
lógico do texto.
Ellen G. White descreve a situação crítica dos líderes
religiosos apóstatas nos últimos momentos da história. Sofrendo sob as pragas,
as multidões reconhecerão o “dedo de Deus” (Êx 8:19) e concluirão que foram
iludidas por seus líderes religiosos. Por isso, dirigirão “suas mais amargas
condenações contra os ministros”. Então se repetirá a matança ocorrida após o
desafio de Elias (1Rs 18:40), e os falsos profetas do tempo do fim serão mortos
por seus próprios seguidores (O Grande
Conflito, p. 655, 656).
Sobre as cabeças da besta, a chave para sua compreensão está
na explicação do anjo (Ap 17:9). Embora o termo “montes” seja tradicionalmente
defendido como “uma alusão à cidade de Roma, com suas sete colinas” (Nichol, p.
855), ele tem um sentido específico na antiga mentalidade hebraica. Daniel orou
pelo “monte santo” do seu Deus, significando que orava por Jerusalém (Dn 9:16).
Jeremias transmitiu uma ameaça divina contra a antiga Babilônia, chamando-a de
“monte” que destrói (Jr 51:24). A pedra que destrói a estátua de Nabucodonosor
se transforma numa grande montanha, o reino de Deus (Dn 2:35, 44). Assim, ao
longo de todo o Antigo Testamento, percebe-se que a palavra “montes” também
representa reinos (ver Sl 48:2; 78:68; Is 2:2-3; 13:4; 31:4; 41:15; Ez 35:2, 3;
Ob 8, 9; Stefanovic, p. 296).
A interpretação católica, por sua vez, tenta restringir a
figura dos sete montes às sete colinas da antiga Roma, para identificar a besta
de Apocalipse 17 com o império romano. Em vista disso, Kenneth Strand, teólogo
adventista já falecido, ressaltou que a tradução correta do termo grego oros em Apocalipse 17:9 é “montes”, não
“colinas”. Afirmou também que, em sentido simbólico, ela sempre deve ser
entendida como reinos e nunca como indivíduos ou governantes (Kenneth Strand,
“The Seven Heads: Do They Represent Roman Emperors?”, Simposium on Revelation – Book II, v. 7, p. 186).
Assim como “montes”, o termo “reis” também representa reinos
(Is 14:4, 22, 23; Dn 2:37, 38, 42-44; 7:17). Portanto, como as cabeças são sete
montes e sete reis (Ap 17:9), e ambos representam reinos, as cabeças também
simbolizam reinos.
Fator tempo – Evidentemente, os sete reinos
representados pelas sete cabeças da besta de Apocalipse 17 foram impérios
sucessivos. Na explicação, o anjo afirmou que, no tempo de João, cinco já
haviam passado e que “um existe” (Ap 17:10). Esta é a principal referência
cronológica da profecia, pois a explicação do anjo fez uma referência aos dias
do profeta. Ekkehardt Mueller, diretor associado do Instituto de Pesquisas
Bíblicas da Associação Geral da Igreja Adventista, afirma que, se a referência
fosse a outro tempo ao qual o profeta tivesse sido transportado, não haveria
como determiná-la. Para que a profecia se faça compreendida, a referência
cronológica na explicação de qualquer profecia é sempre uma referência ao tempo
do profeta. Esse princípio é exposto pelo escatologista Jon Paulien: “A visão
não está necessariamente localizada no tempo e lugar do profeta. Mas, quando a
visão é posteriormente explicada ao profeta, a explicação sempre vem no tempo,
lugar e nas circunstâncias do que tem a visão” (ver Ekkehardt Mueller, “A Besta
de Apocalipse 17: Uma Sugestão”, Parousia,
1° sem. 2005. p. 37; ver também Jon Paulien, Armageddon at the Door, p. 214).
Assim, o versículo 10 constitui a âncora cronológica da
interpretação das sete cabeças da besta de Apocalipse 17, algo que a teoria dos
sete papas ignora. A sexta cabeça representa o Império Romano, existente no
tempo de João. Antes do Império Romano, outros cinco oprimiram o povo de Deus,
os impérios: egípcio, assírio, babilônico, medo-persa e macedônico (chamado de
Grécia, na Bíblia).
O sétimo rei ainda estava no futuro, do ponto de vista de
João, Roma papal, que se tornaria predominante na Europa por mais de mil anos.
Ela é representada pela sétima cabeça, pois, assim como os outros impérios,
também concentrou poderes civis e políticos, incluindo o comando de exércitos e
o domínio de territórios.
Alguns veem inconsistência na interpretação do sétimo rei
como Roma papal, quando se leva em conta que o sétimo rei deveria “durar pouco”
(Ap 17:10). No entanto, segundo Ranko Stefanovic, a expressão “tem de durar
pouco” (do grego: oligon auton dei meinai)
tem um sentido “qualitativo”, da mesma forma que em Apocalipse 12:12, em que Satanás
percebe que “pouco tempo lhe resta” (oligon
kairon echei). Após Cristo subir ao Céu, Satanás percebeu que tinha “pouco
tempo”, e esse período já se prolonga por quase dois mil anos! “Em outras
palavras, a expressão indica que o tempo de Satanás é limitado. A expressão
‘pouco tempo’ de Apocalipse 17:10 está em contraste com mikron kronon (‘pouco tempo’) de Apocalipse 20:3, designado para
Satanás, com referência ao julgamento pendente contra ele” (Stefanovic, p. 521).
O oitavo rei – A figura do oitavo rei e alguns
aspectos relacionados a ele são a parte mais enigmática da profecia. Sobre esse
tópico, a Igreja Adventista do Sétimo Dia não tem uma interpretação
estabelecida. Analisando a história da interpretação adventista de Apocalipse
17, Jon Paulien relata que Uriah Smith nem Ellen White definiram o sentido dos
versículos 7 a 11 (Paulien, p. 166).
Embora contribuições possam ser dadas, é preciso ter prudência,
pois, de acordo com Paulien, “aplicações ultraespecificas para o presente ou
futuro imediato têm levado muitos a erros de interpretação embaraçosos”. Em
alguns casos, é o testemunho histórico do cumprimento profético que nos permite
interpretá-lo. Esse princípio é encontrado em João 13:19: “Desde já vos digo,
antes que aconteça, para que, quando acontecer, creiais que Eu Sou” (ver
Paulien, 166).
Analisando a profecia, percebemos que o surgimento do oitavo
rei está relacionado aos momentos finais deste mundo. Seu aparecimento provoca
admiração mundial (v. 8), sua autoridade dura apenas “uma hora”, ou seja, é efêmera
(v. 12) e, logo que surge, esse poder “caminha para a destruição” (v. 8), pois
vai se unir a dez reis/reinos para enfrentar o Rei dos reis e ser finalmente derrotado
(Ap 17:14; 19:16).
A expressão “era e não é” (v. 8, 11) possivelmente é “uma
paródia do título de Deus como “Aquele que era, que é e que há de vir” (Ap 4:8;
ver 1:4, 8). O título divino se refere ao “nome da aliança de Deus” e a Sua “visitação
escatológica” (David Aune, Revelation
17–22, p. 940. In: Stefanovic, 523), ou seja, Deus agindo no fim dos tempos
para salvar Seu povo e condenar seus inimigos. Se Deus age desse modo, um poder
terreno também atua contrariamente a Ele e a Seu povo. O título “era e não é” contrasta
a onipotência de Deus com a transitoriedade e debilidade das nações (ver Is
40:15).
Outros relacionam a expressão “era e não é” a Roma papal,
representada pela primeira besta ferida mortalmente, mas que se recupera como
força religiosa no fim dos tempos (Ap 13:1-10). Essa posição aparentemente é a
mais plausível, no entanto, colide com pelo menos dois fortes argumentos: (1) A
Igreja Romana do fim dos tempos já está representada na visão como a mulher montada
sobre a besta. É verdade que ela também é representada historicamente como a
sétima cabeça, mas, no desfecho escatológico, a Igreja Romana é representada
como a meretriz; (2) ela será tão somente uma força religiosa, não
político-militar, como a simbologia da besta exige; (3) o oitavo rei, que é a própria
besta (v. 11), odiará a mulher (Igreja Romana e sua confederação, v. 16). Uma
confederação religiosa (meretriz) terá o suporte de uma confederação política (a
besta e os dez chifres), a qual se voltará contra a meretriz e a destruirá.
Alguns ainda enxergam o oitavo rei ou a besta como o próprio
Satanás (Nichol, 856; Mueller, 33), no entanto, esse não parece ser o caso. Embora
a semelhança com o dragão de Apocalipse 12 seja evidente na cor, nas sete
cabeças e dez chifres (Ap 17:3), percebemos que bestas em profecias apocalípticas
geralmente representam impérios perseguidores (Dn 7:5-7, etc.).
Nesse caso também é preciso repetir que a besta odiará a
meretriz e a destruirá (Ap 17:16), o que não faz sentido em se tratando de
Satanás. A desavença na aliança político-religiosa faz parte de um plano divino
(v. 17; ver Ez 23:22-29), não satânico. Também não seria lógico crer que Satanás
destruiria seus próprios instrumentos de engano e perseguição (Mt 12:25). Por
fim, o apêndice da visão (Ap 17:18) deixa claro que a “grande cidade”
(Babilônia mística) domina sobre os “reis da terra” (líderes humanos).
A manifestação final de um poder perseguidor é representada
pelo oitavo, que é a besta propriamente dita (v. 11). É interessante notar que o
texto grego não afirma a existência de uma oitava “cabeça” e omite a palavra “rei”.
Menciona-se apenas o “oitavo”, que, pelo contexto, entendemos ser um “oitavo
rei”. Do versículo 12 em diante, a besta é mencionada nominalmente mais quatro
vezes (v. 10, 13, 16, 17). Isso reafirma que a besta em si será o oitavo rei e
que ela representa um poder mais escatológico que histórico, ou seja, que sua
ação no contexto de Apocalipse 17 está mais relacionada ao fim dos tempos do
que com o passado (embora ela seja julgada pelo que fez no passado). Portanto,
se as sete cabeças da besta representam “reis” (v. 9) ou impérios
perseguidores, o oitavo rei será o último deles.
Uma dificuldade desse ponto de vista é que o oitavo rei
“procede dos sete” (v. 11), talvez indicando que o último império perseguidor
seria Roma papal, que se recuperaria da ferida mortal (Ap 13:12) e voltaria com
força renovada nos instantes finais deste mundo (Paulien, p. 219). No entanto, isso
contraria o sentido geral do texto e confunde as identidades da mulher (poder
religioso) e da besta (poder político). Se a meretriz se prostitui com a besta
(reis da terra), ela não pode ser a besta.
A expressão “procede dos sete” talvez tenha uma relação com a
natureza do oitavo rei, no sentido de que ele seria semelhante aos anteriores (ver
Paulien, p. 219). Alguns enxergam essa expressão como que estabelecendo uma
distinção do oitavo reino em relação aos demais (ver Stefanovic, 525). Contudo,
a expressão pode indicar tanto semelhança quanto distinção. A preposição grega ek, sem equivalente em português, tem o
sentido de “vir de”, como a preposição inglesa from, e foi traduzida em português com o verbo “proceder” (ARA).
João, assim como os demais escritores do Novo Testamento, utiliza
ek abundantemente. Contudo, o texto
joanino tem como uma de suas características marcantes o uso de ek, indicando associação, mesma
natureza, semelhança e, ao mesmo tempo, distinção (confira o verbo “proceder”
em Jo 15:26; 1Jo 2:16, 21; 3:8, 10; 4:1, 3, 5, 7; 3Jo 11; Ap 5:9). Assim, o
texto parece indicar que o oitavo rei “procede dos sete” no sentido de ser como
um deles e não necessariamente ter sido um deles, assim como o Consolador
“procede” do Pai, mas não é o Pai (Jo 15:26).
Que reino ou império (v. 9, 11) poderia ser o oitavo? Em
primeiro lugar, ele deverá ser uma potência que dará apoio incondicional à
Igreja de Roma às vésperas da volta de Jesus. Será um poder coercitivo de
alcance mundial que se unirá aos ainda indefinidos dez chifres (reis ou reinos;
ver v. 12) e que aglutinará todos os governantes da Terra, formando uma
confederação política global (Ap 17:12, 13, 18; 18:3, 9). Essa coalizão se
levantará contra Deus e Seu povo, mas será esmagada pelo Rei dos reis (Ap
19:18, 19). Para Paulien, a identidade do oitavo rei ainda está indefinida, mas
representa a própria coalizão de nações (Paulien, 219).
Vanderlei Dorneles, autor de O Último Império (CPB), acredita que
uma analogia com Apocalipse 13 pode lançar luz sobre a questão (leia o texto dele aqui). Em Apocalipse 13, a segunda besta
(os Estados Unidos, ver O Grande Conflito,
p. 579) será o poder que dará suporte ao papado, exercendo “autoridade” sobre a
“terra e seus habitantes” (v. 12), ou seja, terá uma influência global. Se a
mesma aliança é retratada em Apocalipse 17, com a mulher sendo carregada pela
besta, é possível fazer uma relação entre ambos os capítulos: como a primeira
besta de Apocalipse 13 está para a meretriz, assim a segunda besta de
Apocalipse 13 está para o oitavo rei/reino. Ou seja, o oitavo reino
representaria a superpotência americana que lideraria as nações para dar
suporte à confederação religiosa. “Uma vez que as cabeças representam
reinos/impérios sucessivos, o último ou oitavo deles podem ser os Estados
Unidos, que seriam o último poder político sobre o qual a meretriz está
montada”, afirma Dorneles.
Conclusões – Embora todas as análises de
Apocalipse 17 sejam fascinantes, essa seção está em estudo e uma posição
definida ainda é esperada. Este artigo não se propôs a esgotar a interpretação,
mas o que foi exposto até aqui provê evidências suficientes para se rejeitar a
teoria dos sete reis como uma sucessão de indivíduos ou papas. O contraste
entre a superficialidade da teoria e os sólidos alicerces da interpretação
profética nos relembra a exortação do autor do Apocalipse: “provai os espíritos
se procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo mundo fora”
(1Jo 4:1). Não devemos aceitar prontamente as teorias que batem à nossa porta.
Devemos ir às Escrituras como os antigos bereanos (At 17:11), para não sermos levados
por “todo vento de doutrina” (Ef 4:14).
Por outro lado, no estudo de Apocalipse 17, percebemos como Deus
tem o firme controle da história. Ele já sabe quais serão os próximos passos do
inimigo e utiliza até mesmo suas manobras malignas para benefício de Seu povo. Embora
esteja prevista a formação de uma imensa coalizão político-religiosa contra os
“eleitos e fiéis” (Ap 17:14), Cristo, o Rei dos reis, Se levantará como nosso
supremo Defensor (Dn 12:1). Aquele que nos criou e deu a vida por nós será
nosso refúgio e baluarte. Podemos ter a mesma confiança de que “mais são os que
estão conosco do que os que estão com eles” (2Rs 6:15).
(Diogo Cavalcanti é formado em
Teologia e é editor associado de livros na Casa Publicadora Brasileira)
Semelhantes, mas
diferentes
Apesar das semelhanças, a besta de Apocalipse 17 não é a
mesma do capítulo 13. A besta do capítulo 17 representa uma pluralidade de
organizações (sete impérios sucessivos mais um império final associado a dez
reinos). A besta do capítulo 13 representa apenas um império, Roma papal (O Grande Conflito, p. 54). A besta do
capítulo 13 é um poder político-religioso, por isso tem diademas; a do capítulo
17 é um poder político nos eventos finais, mas não tem diademas, pois rende sua
autoridade à meretriz. Ambas as bestas são semelhantes, por terem relação
direta com o dragão (Ap 12:3). Contudo, é importante lembrar que a besta de Apocalipse
13 está representada historicamente como a sétima cabeça da besta do capítulo
17 e, em seus momentos finais, como a meretriz.