Gostaria de tirar uma dúvida a respeito da informação histórica contida no texto “White Sabbath”:
“A informação bíblica foi ampliada em 1956, quando um tablete de argila escrito em cuneiforme acadiano, vindo das ruínas de Babilônia, foi traduzido por Donald Wiseman, que trabalhou por muitos anos no Museu Britânico, em Londres. O conteúdo desse tablete diz que a captura de Jerusalém pelos babilônicos ocorreu no 2º dia do mês de Adar, em 597 a.C. Fazendo os cálculos necessários, nossa data correspondente é o dia 16 de março, que naquele ano caiu em um sábado. Isto é, a data escolhida para levar hebreus como escravos foi em um sábado, o dia mais santo para essa nação. Hoje, esse tablete está exposto no museu referido acima (BM 21946). Esse, sim, foi um ‘Black Sabbath’. Uma nação encarando as terríveis consequências de uma vida sem Deus; famílias sendo para sempre separadas em completo desespero diante do desconhecido.”
Sem dúvida, o dia da deportação para o exílio ter caído justamente num sábado é uma triste ironia, das consequências da apostasia nacional de Israel. Mas, ao se falar em “cálculos necessários”, quais foram eles? Esses cálculos levaram em conta as mudanças do calendário gregoriano para o juliano, o fato de esse calendário ter colocado como “ano um” o ano em que Cristo já tinha uns seis anos de idade (comédia histórica, Cristo ter nascido antes de Cristo), o encurtamento de dez dias no calendário... ou foi possível usar uma referência mais antiga, que pôde se desviar dessas bagunças que nosso calendário sofreu? – R.
Resposta:
O tablete de argila mencionado no texto é a Crônica de Jerusalém – ABC 5 que diz, no verso, linhas 11 e 12: “No sétimo ano, no mês de Kislimu, o rei de Acade reuniu suas tropas, marchou para a terra de Hatti e sitiou a cidade de Judá e no segundo dia do mês de Adaru tomou a cidade e capturou o rei.”
A partir daí, é preciso estabelecer qual é o sétimo ano de Nabucodonosor. Isso está explicado com mais detalhes no volume 3 do Comentário Bíblico Adventista, no artigo “Cronologia do Exílio e da Restauração”, seção II.
Foi montada a cronologia dos reis babilônicos e persas com base:
1) No Cânon de Ptolomeu, uma lista de reis babilônios e persas, escrita no século 2 a.C. pelo astrônomo Ptolomeu, de Alexandria, no Egito. Essa lista foi fixada por uma série de eclipses mencionados por Ptolomeu em sua obra astronômica Almagesto. A data desses fenômenos astronômicos pode ser precisamente calculada em datas a.C. pelos astrônomos modernos. Porém, os anos de reinado no Cânon de Ptolomeu são estabelecidos com base no calendário egípcio (solar, começando em dezembro), e não no babilônico-persa (lunar, começando em março/abril).
2) Em tabletes babilônicos descobertos pela arqueologia, que consistem em documentos públicos e privados datados, nos quais se menciona o ano de reinado de muitos reis sucessivos; isso nos ajuda a estabelecer em que mês do ano terminou o reinado de um rei e começou o do outro.
3) Em dois tabletes astronômicos que fixam a datação babilônica desses reinados. O primeiro é o VAT 4956. Ele contém uma série de observações astronômicas a partir de Nisã 1 (o dia babilônico do Ano Novo) do 37º ano de Nabucodonosor até Nisã 1 do seu 38º ano. A data de uma única observação astronômica pode ser suspeita de erro, mas os astrônomos modernos nos dizem que uma combinação de registros como a que aparece nesse tablete, quanto às posições do Sol, da Lua e dos planetas, todos eles se movendo em ciclos diferentes, só pode ser localizada num único ano. Assim, o 37º ano de Nabucodonosor foi localizado com precisão, indo de 23 de abril de 568 a.C. a 12 de abril de 567 a.C. Isso, é claro, coloca o primeiro ano oficial de Nabucodonosor em 604/03 a.C., primavera a primavera, e semelhantemente fixa todos os anos de seu reinado.
O segundo tablete é o Kambys 400, que contém uma série semelhante de dados astronômicos, fixando o 7º ano de Cambises no ano do calendário babilônico que vai de 7 de abril de 523 a 26 de março de 522. Esse tablete é interessante porque, entre outros dados, registra um eclipse (que os astrônomos calculam ter ocorrido em 16 de julho de 523 a.C.) que é idêntico ao datado por Ptolomeu no mesmo 7º ano de Cambises. Assim, as duas listas – a egípcia de Ptolomeu, com anos solares, e a babilônica, com anos lunares – são alinhadas uma com a outra, e também são alinhadas com um ponto fixo na escala de anos a.C.
Assim, o sétimo ano de Nabucodonosor fica fixado de 27 de março de 598 a 12 de abril de 597 a.C. O mês de Adaru é o último mês do calendário babilônico, indo, nesse ano, de 15 de março a 12 de abril. O segundo dia de Adaru foi 16 de março (todas essas datas no calendário a.C, isto é, juliano; no calendário gregoriano seria 10 de março). As datas do início de cada mês são obtidas pela visualização da lua nova ao pôr-do-sol, que era quando começava o mês.
Como o movimento dos astros é sempre constante, essas datas de início do mês são projetadas para trás por computador. O dia da semana também é projetado para trás, porque a sequência dos dias da semana é sempre a mesma.
A cronologia babilônica, com a data de início de todos os meses, e o reinado de todos os reis babilônicos/persas, de 626 a.C. a 75 d.C., foi montada por Parker e Dubberstein, em seu livro Babylonian Chronology, e é aceita por praticamente todos os historiadores há mais de 50 anos.
(Rosângela Lira)